Porsche - VOZ EM OFF

VOZ EM OFF

Durante uma corrida, dirige-se intensamente e fala-se muito. A equipe nos boxes está sempre em contato com o piloto e a máquina. É uma comunicação high-tech de regras rigorosas. Em casos de emergência, só para quem tem cabeça fria.

Lá fora na pista, onde homem e máquina rodam a todo vapor, há que se contar com tudo, sempre. Enquanto o carro se move em algum ponto do percurso, o que vale é ter a tecnologia sempre na mira. A cada segundo. De repente apaga-se uma barra de sinal no diagrama. O valor da tensão elétrica é zero. Um zero vermelho. Alarme. O engenheiro no monitor de telemetria no boxe sabe que o Porsche 919 Hybrid está andando somente com o motor a combustão. O problema pode ser resolvido. O importante agora é que a comunicação seja “a jato” entre todos os participantes. O engenheiro, que supervisiona a telemetria para o sistema híbrido, está sentado no escritório de engenharia atrás dos bastidores do boxe junto a outros 30 diplomados de faculdades técnicas, altamente especializados. Ele aperta o botão de intercomunicação e faz uma ligação através deste canal de rádio interno com o engenheiro de corrida no estande de comando no muro dos boxes. A notícia alarmante chega a seus ouvidos simultaneamente de dois lados e de duas maneiras: de forma objetiva pelo engenheiro, e de forma desesperada por Romain Dumas. O piloto vê sua posição ficando para trás, caso o 919 continue sem a propulsão elétrica. O nervosismo do piloto na pista é compreensível. Mas ele não está sozinho. No boxe o importante agora é manter a calma. Faz-se necessária uma análise concreta: o que aconteceu? O que podemos fazer?

Comandos breves e claros são passados de lá para cá, e vice-versa, entre o engenheiro de corridas Mathieu Galoche e os especialistas ao fundo, através do canal de intercomunicação. “Emergency shutdown.” “Iniciar programa de back-up”. O idioma é sempre o inglês, o menor denominador comum na equipe internacional. Traduzindo isso numa frase completa: o programa de parada de emergência desligou o dispositivo de alta voltagem e o piloto tem que reiniciá-lo através de combinações de botões no volante. Ele não escuta nada da conversa no intercomunicador, afinal ele tem que continuar concentrado. A equipe reconheceu a causa e a situação: ao passar bruscamente pelo meio-fio, um fusível de segurança foi acionado, afinal sua função é desligar a energia em caso de acidente. “Ok.” Galoche retorna à transmissão com Dumas. “Temos a solução. Você tem que fazer o seguinte…” As instruções são complicadas. Em princípio, ele explica a Dumas, como apertar Ctrl+Alt+Del em seu volante, coberto com mais de 20 botões, para fazer um reboot no carro… no meio da corrida.

Mas dá certo. A mensagem “Copy”, “entendido”, vem do carro. O engenheiro na telemetria já viu há muito tempo que funcionou. A barra de sinal está lá, firme e forte novamente. Através do intercomunicador ele informa ao engenheiro de corridas que a missão foi cumprida. A reiniciação da parte eletrônica consumiu um pouco de tempo, mas agora os sistemas de recuperação de energia despertaram novamente, o carro revigora-se e volta a fazer boost.

A comunicação entre o carro de corrida e os boxes funciona assim: o Porsche 919 Hybrid é dotado de centenas de sensores. Eles medem, por exemplo, a quantidade restante de gasolina no tanque de combustível, a pressão hidráulica no sistema, as temperaturas do óleo, a temperatura dos freios, a posição do pedal do acelerador, a tensão elétrica, captando também o comportamento do veículo na frenagem e nas curvas. O piloto é transparente. Nada passa despercebido aos engenheiros. Mas mesmo assim eles não podem atuar diretamente. A telemetria unidimensional, com o carro enviando dados aos boxes, é um padrão permitido. Já a telemetria bidirecional, com os engenheiros influenciando o carro, é proibida. Por isso, a radiotelefonia desempenha um papel central.

Quem fala com quem? Para não perturbar demais o piloto, ele só é interpelado por uma única pessoa: o seu engenheiro de corridas. Cada carro tem o seu, e ele fica sentado no estande de comando no muro dos boxes. Por sua vez, o engenheiro recebe um grande número de informações. Os engenheiros o mantêm a par do estado do carro e do comportamento da concorrência. O engenheiro de estratégia discute com ele sugestões para cada situação específica, e o crew chief quer saber se os pneus devem ser trocados na próxima parada para abastecimento e, em caso positivo, qual conjunto de pneus deve ser colocado.

O engenheiro de corridas tem que ter uma cabeça muita fria. Seus canais de rádio não são priorizados. Ele escuta o pessoal falando ao mesmo tempo. E ele jamais pode deixar de escutar o piloto. Se este acusar mudanças na dirigibilidade, desgaste de pneus ou o surgimento de um defeito, deve-se agir imediatamente. Mas nada de afobação! Quando o piloto comunica que não dá mais para rodar com os pneus “slick” (sem sulcos) na chuva que está começando, o engenheiro de corridas tem que pensar rápido. Se o engenheiro que está observando a imagem do satélite lhe disser que só está chovendo naquela parte do percurso e que a chuva já vai parar, e se paralelamente a isso o colega que está de olho nos demais competidores lhe comunicar que a concorrência já está se dirigindo aos boxes para a troca por pneus de chuva, então pode valer a pena acalmar o piloto e mantê-lo lá fora. “Mantenha o carro na pista que a chuva vai parar logo. Não se preocupe, você está indo bem, camarada.”

A voz sonora de Stephen Mitas, o engenheiro de corridas do carro número 20, disfarça o estresse. Assim mesmo, um pouco de risco está sempre presente. Jogar com a ligeira vantagem (de tempo) frente à concorrência faz parte do automobilismo. Por precaução, o engenheiro de corridas avisa pelo rádio o crew chief e os mecânicos: “Preparar para o carro número 20. Serviço completo. Abastecimento, troca de pneus e de piloto.” Brendon Hartley põe o capacete e veste as luvas. O jogo de pneus número quatro está pronto.

A organização da corrida escuta tudo. Se um piloto mandar um rádio de um carro LMP1, a classe superior do campeonato mundial de automobilismo, dizendo “Bandeira azul, bandeira azul!”, ele está criticando o fato de estar impedido de ultrapassar o retardatário. Os organizadores da corrida têm então que assegurar que os comissários de pista de fato mostrem a “bandeira-azul-abre-caminhos” ao retardatário, que, se ignorar o sinal, será punido. E, para divertir os telespectadores, às vezes o diálogo entre o piloto e o engenheiro de corridas vai ao ar na televisão. Alguns códigos são compreendidos apenas por iniciados, afinal os adversários também escutam tudo.

A comunicação moderna em corridas de endurance consiste em atenção total por horas a fio para todos os participantes. Estar sempre em transmissão. Uma sobrecarga de estímulos de enlouquecer qualquer um. Circunstâncias externas podem contribuir para que, mesmo nos dias de hoje, o rádio possa ainda por cima falhar durante a corrida. Aí o que resta como último meio de comunicação entre a equipe e o piloto são os antigos pit boards, do tempo do onça. No entanto, nem as informações para a reinicialização da complicada parte eletrônica poderiam ser passadas dessa maneira, nem Dumas teria tempo de compreendê-las ao passar pelas placas. Cada passo é reconstituído no debriefing, agora sem fones de ouvido e relativamente com calma. O que se deve fazer para se precisar os pré-requisitos para o desligamento automático do sistema? E como é possível ativá-lo novamente o mais rápido possível? Ao final da discussão temos a abreviação “Strat” para estratégia, com um número de dois dígitos. Um novo comando para a comunicação por rádio acaba de nascer. E, se necessário, ele também poderia ser colocado em um pit board.

Texto Heike Hientzsch
Fotos Jiří Křenek